sexta-feira, 10 de junho de 2011

Meio a favor, meio contra

A atual direção do nosso Sindicato é bipolar. Às vezes é a favor da exigência do diploma para o exercício do Jornalismo , às vezes nem tanto. É verdade que faz movimentos na mesma direção da luta nacional em defesa da formação em grau universitário para jornalistas. Mas também é verdade que vive jogando bola nas costas.
Deu um verdadeiro tiro no pé quando defendeu e implementou, sem consultar a categoria, uma política de sindicalização de jornalistas com registro precário. Interpretou, ao seu gosto, um dos artigos do Estatuto da Entidade e passou a sindicalizar não diplomados. Até hoje não se sabe quantos. Mas publicamente, os atuais dirigentes do SJSC seguem dizendo que são favoráveis à aprovação das PECs que tramitam no Congresso Nacional, embora não movam uma palha para que isso aconteça. Até agora, por exemplo, não participaram de NENHUMA atividade nacional em Brasília convocada pela Federação para pressionar a votação das PECs no Congresso .
O capitulo mais recente dessa crise de identidade é a publicação, no site do Sindicato, de um artigo atacando a proposta de novas diretrizes para os cursos de jornalismo que a categoria defende e inclusive aprovou no último Congresso Nacional dos Jornalistas. É salutar que promova o debate. Mas é necessário contextualizar e principalmente abrir espaço para o contraditório. O artigo, de um ex-dirigente da Enecos, aparentemente traduz a opinião dos atuais dirigentes do SJSC.
As novas diretrizes são resultado de um amplo e democrático debate nacional realizado ao longo do último ano do governo Lula. Uma comissão de professores especialista no tema, que incluía uma indicação da FENAJ, professor Eduardo Medtsch da UFSC, coordenada pelo professor José Marques de Melo, realizou audiências públicas em todo País, para as quais convidou todos os segmentos envolvidos com o tema. Abriu prazo para receber propostas desses mesmos segmentos.
Sob a direção da FENAJ, os jornalistas e seus Sindicatos  participaram ativamente do processo. Realizamos seminários, apresentamos um documento com nossas propostas. O documento final da Comissão de Especialistas não incorporou todas as propostas da FENAJ, mas é infinitamente mais avançado que os atuais currículos dos cursos. Traz inovações importantes como o historicamente reivindicado equilíbrio entre teoria e técnica, construindo, assim, matrizes curriculares efetivamente adequadas à formação para o exercício do Jornalismo contemporâneo e estruturadas a partir da função social do jornalista e do interesse público a que deve estar sujeito sua prática. Outra proposição inovadora, constituindo um dos maiores avanços, é a volta dos “cursos de graduação plena”, com autonomia curricular, ou seja, cursos específicos de Jornalismo. Com isto, resgata-se a especificidade do Jornalismo, demonstrada e já consolidada na teoria e na prática mundialmente. E consequentemente, em especial aqui no Brasil, restaura-se e se reforça a constituição da  identidade do Jornalismo.
O documento encontra-se neste momento sob avaliação do Conselho Nacional de Educação, onde a FENAJ, representando seus Sindicatos filiados e os jornalistas brasileiros, recentemente voltou a defender a proposta dos especialistas, conforme deliberação democrática do nosso Congresso Nacional.
Pois é exatamente neste momento que vários segmentos que se recusaram a participar do processo no ano passado resolveram atuar para melar a aprovação das novas diretrizes. As vozes que hoje atacam a propostas são EXATAMENTE as mesmas que atacaram ou fizeram uma defesa envergonhada do diploma para os jornalistas
O principal alvo do ataque justamente o avanço de resgate dos cursos específicos/autônomos de jornalismo. Apóiam-se em uma falácia: a de que a autonomia significa uma separação da área da comunicação, que vai isolar e empobrecer o ensino. Não existe separação. Defende-se os cursos específicos justamente como forma de valorizar o ensino da profissão.
Conforme esclarece o próprio documento dos especialistas, propõe-se a autonomia “sem abdicar de sua inserção histórica na área da comunicação e de sua natureza acadêmica como ciência social aplicada”.  Porque a diluição é herança de um modelo de ensino esgotado.
No seu documento, a Comissão de Especialistas faz uma contextualização histórica,  demonstrando o quanto foi nociva, para a formação do jornalista e consequentemente para o Jornalismo brasileiro, a diluição dentro da Comunicação. Levou a graduação em Jornalismo a não responder “às questões particulares suscitadas pela prática profissional”. A volta do reconhecimento curricular da especificidade deverá, sim, fazer com que a nossa formação tenha o tão buscado equilíbrio entre teoria e técica, retomando uma “via crítico-experimental de ensino-pesquisa”, segundo garante a Proposta.
E não é só o Jornalismo que deve retomar a especificidade curricular em função de problemas de formação gerados pela diluição. O curso de Cinema fez exatamente o mesmo caminho e não se viu ninguém contra. O de Relações Públicas, também em processo de revisão das suas diretrizes, a partir agosto do ano passado, desde as primeiras audiências consensuou que uma de suas grandes mudanças será a volta ao curso específico e autônomo.
Entre outras melhorias, o documento também avança ao atualizar as diretrizes curriculares de acordo com as transformações do Jornalismo. Neste ponto, destaca, entre outras, a assessoria de imprensa, em instituições de todo o tipo, como uma das novas demandas que devem ser mais contempladas na formação profissional. Ao listar os indicativos para a elaboração do Projeto Pedagógico de um Curso de Jornalismo, a Proposta estabelece que, entre outros, deve observar:
 “a) Ter por objetivo a formação de profissionais dotados de competência teórica, técnica, tecnológica, ética, estética para atuar criticamente na profissão, de modo responsável, contribuindo para o seu aprimoramento; [...]
c) Estar focado teórica e tecnicamente na especificidade do jornalismo, com grande atenção à prática profissional, dentro de padrões internacionalmente reconhecidos, comprometidos com a liberdade de expressão, o direito à informação, a dignidade do seu exercício e o interesse público; [...]
e) Cuidar da preparação de profissionais para atuar num contexto de mutação tecnológica constante no qual, além de dominar as técnicas e as ferramentas contemporâneas, é preciso conhecer os seus princípios para transformá-las na medida das exigências do presente; [...]
g) Incluir na formação as rotinas de trabalho do jornalista em assessoria a instituições de todos os tipos; [...]”
 A polêmica extemporânea em torno das novas diretrizes é mais um “round” da longa batalha que travamos em defesa do Jornalismo, da profissão de jornalista no Brasil e da qualidade da sua formação. Só os ingênuos ou os mal-intencionados não percebem ou não querem perceber esse imperativo.
Sérgio Murillo de Andrade e Valci Zuculoto
Jornalistas e professores de Jornalismo

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