segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Defendendo o indefensável

Uma aula de manipulação e dissimulação é a melhor qualificação para o editorial – Mudança de Rumo - publicado nas edições de hoje, dia 31/1, dos oito jornais da RBS e comentado em quase todas as 24 emissoras de rádio AM/FM e nos 18 canais de TV aberta de propriedade grupo gaúcho. Aliás, o próprio tamanho da RBS, uma flagrante contravenção, já é atestado da irracionalidade dos argumentos elencados no editorial que apresenta a posição da empresa sobre a regulação na área da comunicação.

O texto comemora uma mudança no posicionamento do governo em relação ao setor de comunicação. É muito cedo, e não existem indícios suficientes, para concluir que postura será adotada nos próximos quatro anos. Além do mais, o leitor desinformado vai acreditar que os empresários de mídia foram prejudicados ou ameaçados na gestão anterior. Com exceção da Confecom, em dezembro de 2009, e da verborragia sem consequência prática, o governo Lula não moveu um músculo para alterar o status quo que há meio século domina os sistemas de comunicação no Brasil.

“Ao que tudo indica, sairão de cena velhos ranços ideológicos, entre os quais a campanha pelo veto à propriedade cruzada de veículos de informação e a obsessão pelo controle social da mídia, e entrarão em discussão temas objetivos como a própria liberdade de imprensa, a qualidade dos conteúdos e o cumprimento rigoroso dos preceitos constitucionais”.  O redator dessa frase deveria ganhar o troféu cara de pau do ano. Proibir ou limitar a propriedade cruzada é ranço ideológico? Os EUA e a Europa têm, há décadas, mecanismos que coíbem a propriedade de diversas mídias por um único grupo e que estabelecem controle público sobre os sistemas de comunicação. Povo atrasado e rancoroso! Liberdade de imprensa pode ser qualquer coisa, mas com certeza não é um tema objetivo. Na verdade, a expressão adequada, pra eles, é a de liberdade de empresa. E se for pra cumprir rigorosamente a Constituição, que tal colocar em prática o parágrafo quinto do artigo 220 que proíbe o monopólio?

Há um esforço, na maior parte do documento, não bem sucedido, de tentar provar que a inevitabilidade da convergência tecnológica torna também natural a concentração da propriedade e a falta de regulamentação sobre o setor.  A convergência não é apenas inevitável, como desejável. No entanto, é estúpida a confusão deliberada entre plataformas e conteúdos. Da mesma forma, chega a ser ofensivo à inteligência, defender que a produção e distribuição desses conteúdos sejam privilégio de um punhado, cada vez menor, de grupos econômicos que, ao longo dos anos, têm se recusado a admitir qualquer iniciativa de normatização do serviço em bases democráticas.  Pra não perder a viagem, como fazem as empresas em todas as oportunidades, condena, sem direito à defesa, os esforços de parte da sociedade de buscar a democratização e a regulação da comunicação, como fizeram os jornalistas, em 2004, ao propor a constituição de um conselho federal para a profissão.

No final das contas, há somente sentido na última frase do referido editorial: “A liberdade de expressão não é uma prerrogativa dos meios e dos profissionais de comunicação – é um direito sagrado e constitucional dos cidadãos brasileiros”. Irretocável, mas pelo conteúdo do texto e pela prática histórica do baronato da mídia, desconfio totalmente da sinceridade.

Sérgio Murillo de Andrade – Jornalista, Diretor da Fenaj

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Aquilo, sobre o qual não se pode falar

Para imprensa, essa manifestação não aconteceu

Na noite do dia 17 de junho de 2009, milhões de brasileiros surpreenderam-se com a notícia do resultado de um julgamento da suprema corte do País. Poucos minutos antes do horário dos principais telejornais noturnos, os ministros que integram o STF tinham tornado extinta a exigência da formação escolar, específica e em nível superior, para o registro de jornalista no Ministério do Trabalho e Emprego.   A surpresa de tantos cidadãos e cidadãs tinha duas motivações.

A primeira, pelo próprio conteúdo da decisão dos ministros. Como em uma sociedade moderna, com um grau de exigência na qualificação profissional cada vez maior, a Justiça brasileira sinaliza na direção contrária de todas as tendências mundiais de investir na educação e na especialização?  O mesmo cidadão que exige que o professor ou o médico do seu filho ou filha tenha a melhor formação possível tem a exata noção de que jornalismo também é um serviço de natureza essencialmente pública. Por isso, deve ser exercido com responsabilidade ética e apuro técnico, que exigem uma formação escolar de qualidade e continuada.

A outra razão da surpresa é igualmente revoltante e inexplicável. Porque esse assunto nunca apareceu na mídia antes? Quem impediu que um processo com esse alcance e que tenha se arrastado por mais de uma década, fosse levado ao conhecimento da sociedade? Porque os jornalistas, especialmente os com espaço nos meios tradicionais, ignoravam olimpicamente a polêmica?

Nos dias que se seguiram ao julgamento, na presidência da FENAJ, cansei de tentar responder ou explicar a omissão. Ao longo dos anos a Federação, os sindicatos em todo o Brasil fizeram centenas de atos, manifestos, audiências, panfletagens, passeatas. Assembleias, câmaras municipais, Congresso Nacional, reitores, OAB, ABI, estudantes, professores, gente do povo, milhares de posicionamentos públicos em apoio à luta dos jornalistas.  Nada vezes nada era publicado ou divulgado. Era um não assunto. Com honrosas e pontuais exceções, normalmente na mídia pública.

A repercussão da decisão do STF derrubou um dos principais argumentos dos editores e pauteiros: tema sem interesse público. Restaram a covardia, a alienação ou mesmo a adesão consciente aos ditames do patronato.

Todo esse nariz de cera é para acentuar mais uma demonstração típica desse comportamento nefasto ao jornalismo e à democracia.  No começo de dezembro do ano passado a Assembleia Legislativa aprovou por UNANIMIDADE um projeto de lei estabelecendo a exigência do diploma na contratação de jornalista no serviço público do Estado. Acompanhou o posicionamento de diversas outras assembleias e câmaras municipais. O julgamento do STF impede que a União exija o diploma para o registro profissional no Ministério do Trabalho. Não impede e não pode impedir que empresas ou governos definam critérios e qualificação na contratação de jornalistas ou qualquer outro profissional.  

Um dos primeiros atos do novo Governador de SC foi justamente vetar o projeto soberanamente aprovado pelo Legislativo. Vetou com um argumento pífio e obtuso, o de inconstitucionalidade.  Se o  governador Raimundo Colombo pretender que doravante o Estado só irá contratar jornalistas com doutorado, ninguém tem nada com isso. Basta ter uma lei que o autorize.

A aprovação do projeto, o veto, as motivações não mereceram nenhuma cobertura dos jornais, rádios e TVs de Santa Catarina.  Outra vez, nada vezes nada. Não se trata de defender que se abra artilharia  pesada contra o ato do governador. O que seria legítimo, mas insuficiente. Não se está exigindo coragem para enfrentar quixotescamente os interesses do baronato da mídia e promover uma revolução nas redações. Trata-se de defender a missão essencial da imprensa: informar, abrir espaço para o debate público e democrático.  Isso é jornalismo, o resto é armazém de secos e molhados.

Lamentavelmente a atual direção do Sindicato dos Jornalistas de SC parece não perceber essa realidade e que a disputa em torno dessa questão é essencialmente política e ideológica. Passados quase dez dias do veto, ainda está perdida em soluções legais e burocráticas. Ou angaria apoio na sociedade e organiza a categoria num amplo e vigoroso movimento para derrubar o veto, ou seremos, todos, derrotados.

Sérgio M. de Andrade – Jornalista, Diretor da FENAJ

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Vamos derrubar o veto?!

Nós, jornalistas catarinenses, precisamos e podemos promover um amplo e forte movimento de pressão sobre a Assembléia Legislativa para que derrube o veto do governador Colombo (SC) ao projeto que determina a exigência do diploma em Jornalismo para o serviço público estadual. O projeto, de autoria do deputado e jornalista formado Kennedy Nunes (PP),  foi aprovado pelo legislativo catarinense no final do ano passado e vetado pelo governador no último dia 17.

Vamos enviar mensagens a todos os deputados, solicitando a derrubada do veto, explicando o quanto a exigência do diploma é importante para a nossa regulamentação profissional e para a qualidade, responsabilidade e democracia do exercício do Jornalismo no serviço público. Vale lembrar que vários estados e municípios brasileiros já aprovaram exigência semelhante, corrigindo, pelo menos neste setor, o erro histórico cometido pelo STF. 

A exemplo do movimento que os jornalistas gaúchos, liderados pelo Sindicato do RS, realizaram para conquistar a derrubada do veto da então governadora Yeda a um projeto semelhante naquele estado, em 2010, - como bem lembrou o ex-presidente da Federação Sérgio Murillo em matéria anterior -, nesta nossa batalha também podemos solicitar o apoio da FENAJ, do seu GT Coordenação Nacional da Campanha em Defesa do Diploma, dos demais Sindicatos do país, das escolas, professores, estudantes de jornalismo, e demais que têm lutado ao nosso lado pela dignidade e valorização da profissão. Enfim, vamos solicitar a todos potenciais apoiadores que também enviem mensagens aos deputados catarinenses. Vamos postar pedidos de apoio nas nossas listas, twiters e demais redes das quais participamos.

Valci Regina Mousquer Zuculoto 
Professora Jornalismo da UFSC
Diretora da FENAJ
Conselheira do FNPJ

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Confecom sob risco de congelamento

As rececentes manifestações do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, acerca dos rumos que o governo federal dará ao marco regulatório do setor são preocupantes, julga o coordenador-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Celso Schröder. "Ao apontar para uma nova consulta à população brasileira sobre a regulamentação da comunicação, este governo nega a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que foi um espaço legítimo, constituído a partir do próprio governo, com participação da sociedade civil e dos empresários", entende Schröder. Ele ressalta que a Conferência apontou para decisões, para ações, e isso vinha sendo encaminhado, envolvendo muito esforço, muita gente. O governo anterior, além da Confecom, realizou, no final do ano passado, um Seminário Internacional de regulamentação da mídia, produziu um anteprojeto de lei. "Entendo que o governo atual tem a obrigação de se mover a partir desse projeto", destaca o coordenador-geral do FNDC.

"Balcão de negócios"


Já o secretário-geral do FNDC, José Sóter, tem uma avaliação diversa. Para ele, a estratégia de fazer audiências públicas, como o ministro sinalizou, e abrir um amplo debate sobre o marco regulatório é fundamental para construir um dispositivo legal que atenda a todos os segmentos da sociedade. "Vejo como positivo que se abra esta discussão porque até hoje nenhum segmento da sociedade conhece o documento elaborado pelo ex-ministro Franklin Martins, que não foi aberto à participação dos segmentos. Como temos uma conformação diferente nesta nova legislatura, acho que não podemos perder a oportunidade de debater. Queremos saber o teor da proposta e poder discuti-la", ressalta Sóter.

Schröder, entretanto, avalia que a sociedade já se manifestou e essa nova consulta seria para contemplar o grupo de empresários que se recusou a participar da Confecom. "O Ministério das Comunicações precisa, efetivamente, se transformar num ministério de políticas estratégicas de comunicação. Não pode ser o balcão de negócios de atendimento a demandas particulares", afirma o coordenador-geral.

Quebra do pacto

Berenice Mendes, cineasta, membro da Coordenação Executiva do FNDC, ressalta que se não houver andamento ao anteprojeto de lei elaborado pelo governo anterior, a administração de Dilma se iniciará nesta área "com a mesma contaminação de todos os governos para trás dela", avalia Berenice. "Se ela preza tanto a liberdade de expressão, que assegure de forma eficaz tudo o que está previsto no artigo V a Constituição Federal", ressalta a cineasta.

O FNDC solicitou audiências com o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, para tratar dos temas relativos ao período pós-Confecom.

Ana Rita Marini – Jornalista do FNDC

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

STF abre vistas para manifestações sobre ADO 10

Em despacho emitido no dia 27 de dezembro, a ministra Ellen Gracie, do STF, abriu vistas para manifestações do Congresso Nacional, da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 10, encaminhada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A ação pede que o STF determine ao Congresso Nacional a regulamentação de três artigos da Constituição Federal (220, 221 e 223), relativos à proibição do monopólio e do oligopólio na comunicação, o cumprimento de princípios que devem nortear a programação em rádio e TV, além da regulação do direito de resposta.

No despacho encaminhado no dia 27 de dezembro, a ministra determinou a solicitação de informações ao Congresso Nacional, “que poderão ser prestadas no prazo de 30 dias”. Determinou, também, que, recebidas as informações ou transcorrido o prazo, “abra-se vista sucessiva ao Advogado-Geral da União e ao procurador-geral da República, para que se manifestem, cada qual, no prazo de 15 dias”.

Signatário do processo, o jurista Fábio Konder Comparato foi enfático ao comunicar o andamento à direção do PSOL. “Se os barões do setor não querem a regulamentação constitucional da matéria, então digam claramente que pretendem revogar a Constituição nessa parte”, destacou.

Também autor de outras duas ADOs contra o Congresso Nacional sobre tema, em recente entrevista ao portal Vermelho, o jurista sustenta que, para o aprofundamento da democracia no Brasil, é necessário que os meios de comunicação sejam “utilizados pelo povo como seus canais de comunicação e não apropriados por grandes empresários, que deles se utilizam exclusivamente em seu próprio interesse e benefício”. Para acesso à íntegra da entrevista, clique aqui.

Fonte: Fenaj

Um enorme passo atrás

Sérgio Murillo de Andrade, ex-presidente da Fenaj
O governador Colombo (SC) vetou na segunda-feira, dia 17, o projeto do Deputado e jornalista formado Kennedy Nunes (PP), aprovado no final do ano passado, que prevê a exigência de diploma de curso superior em jornalismo na contratação de jornalista para o serviço público no Estado. Vetou na véspera de uma audiência com a Diretoria do Sindicato, que a julgar pelo site da entidade, foi para o encontro com o Governador sem saber da posição já tomada.

É estúpido e sem embasamento consistente o argumento da Casa Civil para sustentar a posição do Governo. Não há qualquer inconstitucionalidade na exigência. O empregador tem toda prerrogativa de definir as qualificações profissionais de quem pretende contratar. A Globo e a RBS fazem isso. Vários ministros do próprio STF já se manifestaram deixando claro que não há contradição na iniciativa de vários estados e prefeituras com o teor do julgamento, igualmente estúpido da Corte Suprema, em junho 2009, que tornou extinta a exigência do diploma como critério para registro no Ministério do Trabalho.  Mas, infelizmente, tem gente que é mais realista que o próprio rei.

Em dezembro, no dia da decisão da Assembleia Legislativa, a direção da Fenaj congratulou o Deputado Kennedy pela iniciativa e se colocou à disposição do Parlamentar e do Sindicato para conversar com o governador.  Nem eu, nem a Valci, ambos diretores da Federação e sindicalizados em SC, fomos contatados. Há sindicatos que reclamam uma presença maior da Federação, outros fazem questão de desprezá-la. Perde a categoria. O Sindicato divulga que vai buscar convencer a Casa Civil a retirar o veto. Desconfio que será perda de tempo. Mas vou torcer pra dar certo. Creio que a Entidade deve é buscar imediatamente mobilizar a Assembleia para derrubar o veto.  No ano passado, os colegas gaúchos, liderados pelo Sindicato, com o apoio da Fenaj, conquistaram a derrubada do veto da então governadora Yeda a um projeto semelhante. Que nos sirva de exemplo.

Sérgio Murillo de Andrade

Jornalista – Diretor da FENAJ